Entrevista exclusiva de Mário Rodrigues a Morten Toft Bech, fundador da Meatless Farm, marca de produtos de base vegetal, alternativos à carne, que se encontra em acelerada expansão mundial

Embora não seja vegetariano nem tenha nunca optado por qualquer tipo de restrição alimentar, pareceu-me oportuno fazer esta entrevista, por ser atual, pouco consensual e muito oportuna dada a premência do equilíbrio e bom senso a todos os níveis, necessário para a nossa saúde e a do planeta. A divulgação de opiniões e a  informação são um “alimento” intelectual fundamental.

Como surgiu a criação da Meatless Farm?

A ideia de criar a Meatless Farm surgiu em 2016, quando eu e a minha família decidimos reduzir o consumo de carne, mas não conseguimos encontrar uma alternativa que satisfizesse todos os membros da família, nomeadamente em termos de sabor, e que estivesse disponível a um valor acessível. Paralelamente, e ao pesquisar sobre o assunto, fui descobrindo mais informação sobre os danos ambientais provocados pela produção de carne, o que me estimulou, ainda mais, a agir.

Depois de dois anos dedicados à pesquisa, a testes de fórmulas e à recolha dos ingredientes de forma sustentável, consegui criar o “picado” de base vegetal fresca e original. Finalmente, em 2018, lancei o produto sob a marca Meatless Farm, que, nesse mesmo ano, atraiu o interesse da cadeia de supermercados britânica Sainsbury’s, atingindo, desde logo, uma grande visibilidade de mercado.

Como tem evoluído a implementação da Meatless Farm nos mercados em que está já inserido?

Estamos orgulhosos por, em apenas três anos, termos conseguido posicionar a Meatless Farm como uma das marcas de produtos de base vegetal com um dos mais rápidos índices de crescimento na Europa. Atualmente, estamos presentes em 24 países, com grandes parceiros de retalho e food service, e o feedback dos consumidores tem sido bastante positivo. A Meatless Farm tem o objetivo de reduzir em 50 por cento o consumo mundial de carne, o que implica uma integração na cultura alimentar dos países em que está presente, mostrando a diversidade da alimentação de base vegetal.

A nossa essência passa por desafiar os limites do veganismo e chegar aos consumidores que pretendem, apenas, reduzir o consumo de carne, sem sacrifícios nem fundamentalismos. Cumprimos esse desígnio ao sermos ousados e criativos na nossa abordagem ao mercado, modelo que privilegia quer o canal do retalho quer o de food service, em igual medida. Ganhar força nos dois canais é extremamente importante. Só desta forma conseguiremos atingir o ritmo de adoção de propostas alternativas à carne necessário para alcançar as ambições ambientais que delineamos. Consideramos que encorajar pequenas mudanças em muitas pessoas é muito mais poderoso do que grandes mudanças em apenas algumas pessoas.

Qual pensa vir a ser a evolução temporal desta transformação?

Já estamos a assistir a um crescente número de consumidores que aceitam “experimentar pela primeira vez”, entrando, assim, para a categoria de alimentação de origem vegetal. No entanto, existe o risco de que, com muita oferta de alternativas à carne de marcas próprias, focadas no preço em vez da qualidade, alguns consumidores possam ter uma má experiência inicial, dificultando o crescimento da categoria. Apesar disso, o papel que a nossa marca desempenha para o crescimento do setor de alimentação de base vegetal está a atrair o interesse. O nosso propósito – o de criar um sistema alimentar sustentável – reflete-se nos consumidores, independentemente da sua identidade.

Quais os planos da Meatless para ajudar a alterar os enraizados hábitos alimentares diferentes em cada país com diferentes culturas?

A familiaridade está no cerne da cultura alimentar. Cada mercado apresenta pratos diferentes e, por isso, o nosso foco está na criação de alternativas à carne, com proteína vegetal, que permitam recriar os pratos mais característicos, familiares e famosos. Para acelerar este processo, apostamos nas parcerias com cadeias de restauração de diferentes mercados onde estamos para apresentar o produto aos consumidores, adaptando-o à cultura alimentar de cada país. Nos Estados Unidos, por exemplo, firmamos uma parceria com a cadeia de hot dogs Nathan’s Famous, para produzir a primeira oferta vegetariana desta cadeira com mais de 100 anos. Já no Reino Unido, ajudamos a cadeia Pret A Manger a recriar o seu ex-libris, o prato de almôndegas, numa versão sem carne, com recurso aos nossos produtos.

A acessibilidade em termos de preço desempenha, também, um papel fundamental no desbloqueio do consumo deste setor. Neste sentido, a Meatless Farm está a trabalhar no sentido de oferecer um produto que se diferencie pela relação preço-qualidade, e isto em relação às marcas que se dedicam a propostas de origem vegetal ou animal. Apesar de a indústria da carne contar com centenas de anos de inovação em termos de eficiência da sua cadeia de abastecimento, o setor de base vegetal vai mover-se rapidamente, não tenho dúvidas. Trata-se de uma jornada.

Gostaria apenas de introduzir a mais recente conquista da Meatless Farm, no sentido de conseguir uma cadeia alimentar mais sustentável para o planeta. Juntamente com outras marcas multinacionais e retalhistas ligados ao setor alimentar, estamos a trabalhar com a Foundation Earth, organização que visa fornecer informação pormenorizada sobre o impacto ambiental dos produtos, possibilitando, assim, que o consumidor possa fazer escolhas mais informadas, nomeadamente quando se trata da sua comida.

Entrevista de Mário Rodrigues