Foi em Novembro de 2018 que Gil Fernandes assumiu a chefia da cozinha do Hotel Fortaleza do Guincho — Relais & Chateaux, depois de três anos enquanto sous chef do restaurante do hotel

Devidamente acomodado, começa a provar que arrojo e consistência para ocupar o lugar não lhe faltam e que, em consonância com o registo a que o Fortaleza nos habituou, está preparado para trazer novas histórias e sabores à mesa.

O cozinheiro deixa a cozinha aberta ao espaço que a envolve. O mar inunda os pratos, como sempre, mas a Serra de Sintra está mais presente também. “O foraging é importante porque traz ao cliente a flora de que dispomos à nossa volta, na praia e na serra de Sintra. Encontramos sabores diferentes, só nossos, que partilhamos com os clientes”, conta Gil Fernandes, adicionando que são também momentos em que “a equipa respira ar fresco e se inspira para novas criações”. Tudo isto ganha contornos especiais quando, para o actual chef do Guincho, há nesta acção uma influência familiar e afectiva: “tudo começou quando a minha avó, obcecada com as ervas tradicionais terapêuticas, me levava com ela ao mato, para apanhar ervas para os chás. É daí que vem o gosto pelo que é natural e sazonal”, explica.

Nas mais recentes entradas no menu do restaurante, há funcho do mar, apanhado diariamente, algas, funcho selvagem, azedas, chagas, zimbro, alecrim… Na primavera chegarão as flores e recomeçará um trabalho de descoberta sem fim à vista. 

Mergulhado com toda a dedicação no projecto, Gil Fernandes encontra no Guincho um palco perfeito para o peixe e marisco, que tanto gosta de trabalhar. Há, por exemplo, camarão vermelho, linguado e robalo, tudo da nossa costa, mas o cozinheiro também se debruça sobre o rio… e agita as águas. Quem diria que o Fortaleza do Guincho serviria peixes como a Lampreia? “Fazer um prato com lampreia num restaurante com clientes exigentes como nós temos é arriscado. No entanto, faz parte de mim querer demonstrar que podemos comer tudo, desde que cozinhado da melhor forma”, explica. Para além disso, “a lampreia assenta no tema da sazonalidade, vai ao rio desovar e é nesta época do ano que a encontramos nas melhores condições”.

O estilo clássico tão intrínseco ao restaurante está lá, mas rejuvenescido. “Ser jovem é relativo, pois tudo depende muito da experiência. Apesar da minha idade trabalho em restauração há 14 anos”, começa por dizer quando se toca na temática “do ainda jovem chef”, não negando que ser o mais jovem cozinheiro a ocupar o lugar de Chef Executivo da Fortaleza do Guincho há-de deixar as suas marcas. “Creio que poderemos encontrar alguma irreverência em alguns pratos, espero trazer ainda mais dinâmica e criatividade, para que a experiência gustativa seja cada vez melhor”.

Os pratos novos são alguns, e já estão incluídos no menu. Há um snack de Frango no churrasco versão Estrela Michelin, com rolo de pele de frango com frango grelhado, puré de tomate e batata frita, e o Conta-gotas, uma mini couve recheada com tártaro de camarão, um prato que se não é um jardim, é pelo menos um canteiro, que chega à mesa com sistema de rega de onde sai o sumo de couve fermentada. Nos amuse bouche chega a Salada de polvo, com puré de batata doce, molho de batata doce fermentado, e molho de polvo e chouriço, e a também pouco-vista-no-fine-dining Moreia frita, com um crocante feito com a pele do peixe, moreia curada, torresmo da moreia, maionese de funcho do mar e lima caviar. Pela sua untuosidade, a moreia acompanha o momento do pão (de centeio e trigo, feito na casa) e das manteigas, em que também houve alterações: agora chegam-nos em forma de seixos, como os da praia do Abano que inspiraram o chef, servidas sobre um seixo cortado ao meio: o seixo branco é manteiga de emulsão de azeite, o castanho manteiga de ovelha de Seia e o negro, de algas.

Nos pratos principais, há Camarão vermelho da nossa costa, com rabanetes e tangerina, sumo de tangerina e molho de gamba fermentado, e Linguado selvagem a baixa temperatura, berbigão à Bulhão Pato e açorda de milho sob a já conhecida concha de massa crocante do restaurante. A Lampreia chega sobre uma tosta, com presunto, coberta pela pele do peixe cozida, e com um molho feito a partir das espinhas e do sangue do animal, a fazer lembrar a lampreia à bordaleza. O Robalo de anzol acompanha com couve branca, crocantes feitos da pele do porco (comer couratos, na Fortaleza do Guincho, quem alguma vez ousou imaginar?) e depois chega o resto do prato, uma Sopa de cozido irresistível.

Nas sobremesas, Filipe Manhita apresenta Citrinos e Avelã, servido em dois pratos que inclui laranja sanguínea confitada e yuzo, a elevar o final de experiência .

Gil Fernandes tem 29 anos, nasceu na Lourinhã. Formou-se na Escola Superior de Hotelaria e Turismo e passou pelo Hotel Tivoli, pelo Vila Joya (2** Estrelas Michelin) e pelo Ocean (2** Estrela Michelin). Além disso, ganhou mundo nos melhores, como o De Librije (3*** Estrlas Michelin, na Holanda), o Geranium (2** Michelin, na Dinamarca) ou o  Martin Berasategui (2** Estrela Michelin, em Espanha). Desde 2015 na Fortaleza do Guincho, tem vindo a conquistar o seu espaço e demonstrar que o merece. 2018 foi um ano de viragem, mas o cozinheiro está focado no futuro — ideias e criatividade não faltam!